segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Entre a miséria absoluta e a ostensividade aristocrática


O esforço para escancarar as portas do desenvolvimento deve ser progressivo e continuado.

No plano da educação, conquistamos vitórias expressivas quando abordamos a questão da alfabetização.

Em 1900, quase 70% da população brasileira com mais de 15 anos era constituída de pessoas analfabetas. Hoje, cerca de 11% da população carrega esta hedionda cruz de chumbo. Os números sinalizam que não ficamos parados no tempo, que avançamos em alguma medida, mas 11% é um indicador grave demais para merecer a indiferença do governo e da sociedade.

Se 11% de analfabetos já é um dado inaceitável, o que se poderia então dizer em relação à taxa de analfabetismo funcional? Nessa seara retornamos aos idos de 1900, ao começo do século passado, ostentando uma vergonhosa taxa de 71%. É isto mesmo, 71%; é mole?!

Um dos maiores problemas entre nós é o nível das contradições, por demais aviltantes. Já virou lugar comum a constatação de que no Brasil convivem lado a lado Gabão e Suécia, a miséria absoluta e a ostensividade aristocrática.


Esta realidade deixa cicatrizes em todos os setores. E também na educação. Os dados sobre analfabetismo afrontam outros de qualidade seletiva, como os que mostram as crianças brasileiras arrebatando as primeiras colocações nas olimpíadas de matemática realizadas mundo afora.

Mas quando rompemos as barreiras da exceção e adentramos no Brasil real, verificamos que a “situação do ensino matemático no Brasil é dramática”. É o que vem denunciando Suely Druck, presidente da Sociedade Brasileira de Matemática.

Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Paulo Montenegro - vinculado ao Ibope, e pela ONG Ação Educativa, cerca de 30% da população do país resolvem operações matemáticas simples com extrema dificuldade. Conseguem no máximo fazer operações simples, envolvendo a adição, subtração, multiplicação e a divisão. São 52 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos que não conseguiram romper os estreitos limites da aritmética, mantendo longa distância do universo da matemática.

Ainda na faixa etária dos 15 aos 64 anos, mais de três milhões de brasileiros são analfabetos absolutos em matemática. Não conseguem sequer ler ou identificar números simples, como o número que identifica uma casa de determinada rua, ou o número do telefone de um posto de saúde.

Segundo a pesquisa, apenas 23% da população adquiriu a habilidade de conhecer os números plenamente, elaborando cálculos e interpretando mapas, tabelas e gráficos.

Outro grave problema identificado pela pesquisa é que 60% dos entrevistados com até a 3ª série do ensino fundamental não conseguem resolver espécie alguma de cálculo. Estamos, portanto, refletindo sobre alunos que freqüentam ou freqüentaram a escola, o que torna o quadro mais dramático ainda.

Segundo a presidente da Sociedade Brasileira de Matemática, isso decorre do fato de que “mais de 60% dos nossos professores desconhecem o conteúdo que têm que ensinar”.


No Brasil, desde sempre, a educação encontra-se na lata do lixo. Todo esforço despendido até aqui conferiu apenas uma casca de verniz à questão, criando – quando muito - bolsões de excelência encravados num mar de vergonhosos fracassos. Criminosos fracassos.

Quantas décadas mais serão necessárias para modificar este cenário tão inóspito, caberá à sociedade responder.

Artigo (publicado em março de 2008) de Antônio Carlos dos Santos publicado na Revista Bula e no portal da Associação dos Professores de São Paulo. Antônio Carlos é o criador da metodologia de Planejamento Estratégico Quasar K+ e da metodologia de produção de Teatro Popular de Bonecos Mané Beiçudo. vilatetra@gmail.com